5 de outubro de 2012 | By: Rita Seda Pinto

Talha São João

Talha São João


Rita Seda



Se eu vejo uma talha São João, aquela de cerâmica, com a figura do Santo, vela purificadora na parte superior, lembro-me de Maria Augusta. Faz parte da minha vida de vicentina. Nossa conferência dava assistência à sua mãe, numa das casinhas da Vila Vicentina. A velha senhora vivia acamada,naquele tempo ainda não havia aposentadoria como hoje, ela dependia de nós para a alimentação, remédios, roupas. Tendo diversos filhos, mas sem condição financeira também, não deixavam faltar o mais importante, que é a presença, o carinho e respeito. Sempre havia algum tomando conta dela. Maria Augusta trabalhava em São Paulo, era solteira, assim que se aposentou decidiu que era hora de vir para cá e cuidar da mãe, o que fez até o fim. Aos outros irmãos, ficaram as visitas. Sendo que ela também foi perdendo as forças, seu irmão construiu uma casinha nos fundos da sua, para que morasse. Continuamos a visitá-la. Era doente, mas, acostumada com os trabalhos na capital, numa firma de eventos, era caprichosa com seus pertences. O fogão vivia coberto com protetores especiais de papel alumínio, nenhum outro o igualava em limpeza. Não se via uma poeirinha em seus poucos pertences. Os panos de prato eram os mais brancos possível. As panelas brilhavam. Naquela casa tudo exalava perfume. Tinha um modo especial de fazer seu arroz. Nunca comia na casa dos outros, embora sozinha, sempre fazia seu alimento. Não abria mão de carne, frutas e verduras. Um vendedor de horti-fruti ia, semanalmente, surtir sua geladeira. Muitas vezes nos esperou com um gostoso arroz doce. Não saía à rua, a não ser para cuidar da saúde. Uma senhora fazia a caridade de receber sua aposentadoria. Se a casa era organizada, o mesmo acontecia com seus vasos de flor. Orquídeas, avencas, rosas, samambaias e malvas coexistiam, harmoniosamente, na beira da casa... Além de levar-lhe a Palavra de Deus e rezar com ela, nossa missão consistia em levá-la ao médico, fisioterapia, comprar seus remédios, que quase nunca pagávamos. Fazia questão de pagá-los. Quando precisou fazer fisioterapia no Asilo Ivon era o seu motorista. Nisto ocorria algo engraçado: ele sempre teve a Belina e um carro melhor. Se acontecesse um problema no carro melhor e ele aparecesse de Belina ela reclamava. Gostava do carro confortável. Nós achávamos graça! Era toda coração. Se elogiássemos uma flor, plantava a muda numa lata e nos dava. Se ganhasse alguma fruta, queria que experimentássemos. Não sei bem quem ali era socorrida. Se ela ou nós. Formou-se um elo de amizade tão forte que envolveu toda sua família. Após sua morte, continuamos o contato e continuamos a socorrê-los quando acontece precisar, até hoje. A talha? Ah! Era seu único luxo. Se achasse que precisava trocá-la só aceitava substituir pela mesma marca. Virava um bicho se levássemos outra. E tanto a lavava e esfregava que a desgastava bem depressa... Saudades, Maria Augusta! Pede a Deus por nós!

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